Há esperança
Na última sexta fui ao Sesc aqui em São José dos Campos
ansioso para ver o show do Cama de Gato, grupo lendário da música instrumental
brasileira. O grupo foi fundado em 1982 pelo saxofonista/flautista Mauro Senise
e o baterista Paschoal Meirelles – que permanecem na formação atual – além do
baixista Arthur Maia e o pianista Rique Pantoja, todos instrumentistas hoje consagrados
na MPB. Atualmente conta, além de Meirelles e Senise, com Jota Moraes no piano,
André Neiva no baixo e Mingo Araújo na percussão.
O show era gratuito (belo habito do Sesc aqui) e antes fiquei
imaginando se tal constelação de músicos – todos podem ser colocados entre os
melhores do país nos respectivos instrumentos – atrairia público decente no
país do Lek Lek (e está aí a Mercedes Benz que não me deixa mentir). Ia ser
constrangedor ter espaço vazio para prestar a reverência que o grupo merece. Chegando
lá respirei aliviado: casa cheia e público empolgado, que vibrou com o show.
Então creio que posso dizer que há esperança. Há ainda público para valorizar
um estilo de música que não toca nas rádios ou tv. E músicos que, apesar de não
serem conhecidos do grande público, são lendas como Senise e Meirelles.
E o show em si foi inesquecível. Já falei sobre o
virtuosismo dos instrumentistas do grupo, músicos incríveis e que fizeram
coisas sensacionais. Acho que o músico virtuoso e um craque de futebol como
Ronaldo ou Messi têm algo em comum: fazem coisas fantásticas que conseguem, ao
mesmo tempo, ser inacreditáveis e parecer fácil (para eles ao menos). Porém,
acima disso, eles conseguiram uma coesão de som além do normal, soando de fato
como um grupo e não uma reunião de músicos.
O show faz parte de um ciclo em homenagem ao Weather Report,
grupo de jazz fusion de Wayne Shorter e Joe Zawinul – e que já teve em suas
formações Airto Moreira e Jaco Pastorius – e que foi uma das bandas mais
influentes do jazz dos anos 70 e 80. Porém, arrisco dizer que o Cama de Gato não
ficou devendo nada ao Weather Report ou mesmo ao Return to Forever, outra
referência do jazz fusion, composta por Chick Corea, Stanley Clarke, Al di
Meola e outros. Músico por músico, temos uma disputa boa, quase um empate
técnico. Tenho dúvidas, porém, se alguma dessas bandas conseguiria imprimir um swing
que é brasileiro e quase inimitável na sua seção rítmica. Se o jazz fusion é a
mistura do jazz com rock e outros elementos, o Cama de Gato ainda acrescentou
temperos brasileiros do samba, choro e baião. Não é qualquer “cozinha” que prepara
um prato desses.
Por fim, a única nota depreciativa do público foi, em vários
momentos, a conversa excessiva. Faltou em determinados momentos um pouco de
respeito ao grupo, como se eles estivessem lá para fazer um fundo sonoro para
alguns mal educados papearem. Porém, como disse antes, há esperança. Aos poucos,
quem sabe, a plateia vai se educando para apreciar o que é grandioso.
Comentários
Postar um comentário