Dez discos
Há muito tempo atrás fui desafiado, nessas brincadeiras de
facebook pelo amigo Vagner Ricardo, a postar a cada dia algo sobre os dez discos
mais importantes para mim. Não curto essas brincadeiras e até por conta falta
de tempo daqueles dias, não segui com a corrente. Porém, aproveitando um
momento à toa, vou comentar quais são esses discos, de uma tacada só. Vamos ao
que interessa. É difícil falar só em 10 discos, mas tentei listar aqueles que
realmente me importam, mas não sem uma certa dor no coração por excluir outros.
A ordem não significa preferência ou qualquer escala. Quem quiser é bem-vindo
para comentar, discordar e acrescentar outros discos aí na lista. As capas
estão na ilustração acima, da esquerda para a direita, de cima para baixo.
1. Abbey Road: na minha lista não podia faltar Beatles. Acho
esse disco simbólico por alguns motivos, inclusive por ter sido o último que
eles gravaram em estúdio antes de romperem. Ainda assim, capricharam. É um
disco de uma qualidade e apuro que não se vê por aí com facilidade. E quem ouve
não consegue perceber que a existência da banda andava por um fio. Gosto de
achar que eles devem ter pensado assim: “se é para terminar, vamos chutar o pau
da barraca. Quem vier depois vai ter que rebolar para fazer algo tão bom.” Além
de grandes canções de Lennon e McCartney, as obras primas “Something” e “Here
comes the sun” de George Harrison apontavam para a qualidade do seu trabalho,
que seria revelado em sua plenitude logo depois no álbum triplo (!!!) “All
Things Must Pass”.
2. Disraeli Gears: sou fã do Cream de longa data. Eles foram
precursores de muita coisa, inclusive do formato “power trio” no rock. Todo
mundo na banda tem que ser muito foda para segurar o som só com baixo, guitarra
e batera. E eles foram muito felizes nesse disco virtuoso e furioso, conduzido
por três mestres dos respectivos instrumentos: Eric Clapton (guitarra), Jack
Bruce (baixo) e Ginger Baker (bateria).
3. Tropicália ou Panis et Circensis: um disco coletivo e
marco fundador do movimento tropicalista precisa estar em qualquer lista de
álbuns importantes. Gil e Caetano já tinham feito barulho com seus álbuns
lançados pouco antes, e ainda abriram espaço para outros artistas como Gal
Costa, Os Mutantes e Tom Zé. Sob a batuta e orquestrações brilhantes do maestro
Rogério Duprat, os artistas fizeram um álbum coeso e bem trabalhado, lançando
as bases de um novo tempo na MPB que abria as portas do estilo para a guitarra
elétrica, a psicodelia e toda uma transformação de costumes pela qual o mundo
passava.
4. Sticky Fingers: também não podia faltar Rolling Stones e
esse é um clássico. Na minha opinião, é a melhor fase da banda, com Mick Taylor
na guitarra. É um disco vibrante de rock e blues na veia do começo ao fim. Como
eu escrevi certa vez, acho que os Stones nunca conseguiram fazer um álbum no
mesmo nível de qualidade dos Beatles. Mas os Beatles nunca conseguiram fazer um
riff tão vibrante e cheio de energia como, por exemplo, em “Bitch” ou “Brown
Sugar”.
5. Meus Caros Amigos: Chico Buarque no seu auge. Um disco ao
mesmo tempo requintado e afiado. Chico está, com certeza, na lista dos maiores
compositores do país. É um letrista e compositor inspirado, de modo que é
difícil escolher algum de seus álbuns. Mas quando ele reúne em um só disco pérolas
como “O que será”, “Mulheres de Atenas”, “Vai trabalhar, vagabundo” e outras
tantas, não dá para deixar esse disco de fora de qualquer lista.
6. Clube da Esquina: uma obra de arte do começo ao fim. Fico
pensando se Milton, Lô Borges e companhia tinha dimensão, quando estavam
gravando, da grandeza da obra e da revolução que eles estavam causando na
música popular (e olha que não estou falando só de Brasil). Contra todos na
gravadora, Milton bancou o lançamento de um álbum duplo com um jovem e
desconhecido Lô Borges. Coragem para fazer e arriscar não faltou. E hoje é um
álbum reverenciado no mundo todo, mostrando que o Brasil é mais que samba ou
bossa nova.
7. Inseto Raro: é um disco notável e com um valor
sentimental grande para mim, já que assisti ao lançamento do show e, depois, à
gravação do disco na Casa da Ópera em Ouro Preto. Voz e violão e nada mais. Mas
não é qualquer voz: é Titane, uma das maiores cantoras do Brasil, que domina a
voz como ninguém, indo do sublime à potência com uma interpretação magnífica,
que vai muito além da técnica. E o talentosíssimo Gilvan de Oliveira no violão e conduzindo arranjos incríveis. Até hoje me arrepio quando ouço a versão de Titane para “E
daí (a queda)” de Milton Nascimento e Ruy Guerra.
8. Os Afro-sambas: outro disco que te prende do começo ao
fim. É, ao meu ver, um álbum conceitual no significado pleno da palavra, apesar
dessa expressão ter ganhado popularidade só um ano depois, com o Sgt. Pepper’s
dos Beatles. Da reunião de Vinícius de Moraes com o violão virtuoso de Baden
Powell só poderia sair coisa boa, mas ainda assim acho que esse disco supera
qualquer expectativa. Creio que, em termos de samba, deve se dar destaque ao
disco por ter rompido com o “Rio-centrismo” do estilo (e, definitivamente, com
estética “copacabanista” da bossa nova), abrindo, assim, caminhos para uma
ampliação estética da música brasileira que viria logo a seguir com a
tropicália.
9. Krig-ha, bandolo!: Raul Seixas é um nome muito importante
na minha memória afetiva musical. Mas sua relevância vai muito além disso. É,
sem exageros, um dos pais do rock brasileiro. É óbvio que tinha muita gente
fazendo rock antes dele, mas Raul trouxe algo genuinamente brasileiro para o
estilo ao misturar Luiz Gonzaga com Carl Perkins ou Jackson do Pandeiro com
Gene Vincent. Raul era não só um compositor inspirado, mas sua bagagem de
produtor antes da fama o qualificava para fazer discos apurados, como ele
mostra em Krig-ha. Aliás, ele emplacou logo depois uma sequência de discos
memoráveis: Gita, Novo Aeon e Há Dez Mil Anos Atrás. Qualquer um poderia estar
nessa lista, mas acho o Krig-ha meu favorito por reunir petardos como “Metamorfose
ambulante”, “Rockixe” e “Ouro de tolo”.
10. As Quatro Estações: é impossível não lembrar de uma das
bandas mais simbólicas do período que ficou conhecido como Rock BR, os anos 80.
A Legião e seu arauto Renato Russo influenciaram toda uma geração de jovens e
tem seu lugar guardado no panteão dos grandes artistas. Esse disco é daqueles “clássicos
automáticos” por reunir tanta música boa, além de ter conseguido muito sucesso
comercial com cerca de dois milhões de cópias vendidas. Resultado mais do que
esperado para um álbum que traz músicas como “Há tempos”, “Pais e filhos”, “Meninos
e meninas” e outras.
Se pudesse, ainda esticava a lista para incluir uma série de
discos que me são importantes e estão sempre rodando na vitrola. Se pudesse por
mais uns, por exemplo, acrescentaria o “Layla”, do Clapton, “Elis & Tom” e
o “Blonde on Blonde” do Dylan. Mas por hoje está bom. Como sempre digo, discos clássicos
não o são sem motivos. E vamos ouvir música.
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