Garimpeiros de músicas
Nas minhas andanças “internéticas”, descobri mais um ótimo canal sobre música no YouTube, o “Alta Fidelidade”, do jornalista e escritor Luiz Felipe Carneiro (conheça o canal AQUI). No canal ele apresenta notícias sobre música, resenhas de discos, entrevistas com artistas e profissionais de música e outros assuntos. Como escrevi em outra coluna, o YouTube se tornou um terreno fértil para canais dedicados a essa nobre arte, com canais diversos e com rico material para quem gosta do assunto. Além do “Alta Fidelidade” e os que citei na outra coluna, tenho seguido também os canais “Kazagastão” e o “Music Thunder Vision”, ambos de ex-VJs da MTV Brasil, o Gastão Moreira e o Luiz Fernando Duarte, o Thunderbird.
Mas, voltando ao “Alta Fidelidade”, assisti a duas entrevistas interessantes com personagens importantíssimos na pesquisa e no resgate de capítulos importantes da música brasileira: Charles Gavin e Marcelo Fróes. O primeiro é mais conhecido por ter sido o baterista dos Titãs em sua fase de maior sucesso e, mais recentemente, como apresentador do excelente “O Som do Vinil”, exibido no Canal Brasil. O segundo é um ex-advogado ligado ao mundo da música há muitos anos e fundador do selo “Discobertas” e da “Sonora Editora”, ambos responsáveis por lançamentos excelentes de discos e livros. Eles se especializaram em revirar arquivos de gravadoras atrás de gravações originais de discos importantes e de material de estúdio descartado, além de raridades, como gravações de ensaios, fitas com as primeiras versões de músicas (as chamadas fitas demo, de demonstração) ou mesmo gravações caseiras ou feitas em shows.
A parte visível desse trabalho são os relançamentos, sejam de CDs individuais ou caixas de discos, cujo acabamento pode ser simples (um mero envelope para alguns CDs) ou até mesmo em formatos mais luxuosos. Charles Gavin, por exemplo, no começo dos anos 2000 lançou a coleção “Dois Momentos”, na qual uma série de trabalhos clássicos voltou ao mercado em CDs que traziam compilados, na ordem dos originais, dois álbuns de um artista ou grupo. Criticado em parte pelo aspecto gráfico, que não valorizava as capas originais (as duas capas vinham em um tamanho minúsculo na frente do CD), o projeto teve os méritos de oferecer os discos a preços populares e, principalmente, apresentar às novas gerações trabalhos há muito fora de catálogo. Fróes, por sua vez, tem no currículo um número enorme de caixas e de lançamentos de raridades, com destaque para os trabalhos com os acervos de Gilberto Gil e de Renato Russo e a Legião Urbana.
A parte invisível – e hercúlea – dessas iniciativas são as incontáveis horas de audição de fitas e as negociações sem fim com artistas, herdeiros, gravadoras e seus advogados. As fitas originais estão, em muitos casos, perdidas em prateleiras e o grande desafio é a quantidade de material não catalogado. Inúmeras caixas de fitas não possuem nenhuma identificação e a solução é ouvir uma por uma. Esse processo permitiu, por exemplo, o lançamento de um show ao vivo de Caetano Veloso acompanhado da renomada banda Black Rio, gravado em 1978, e que o próprio artista ignorava a existência da gravação. O disco só veio à tona em 2002 graças ao trabalho paciente de Gavin, que encontrou e trabalhou as fitas.
Fróes e Gavin são unânimes em apontar que há vários tesouros não lançados, seja porque artistas ou gravadoras não quiseram tocar alguns projetos para frente por razões diversas (falta de interesse, previsão de baixo retorno financeiro e outras), seja porque há material por ser descoberto. Porém, ambos fazem um alerta importante: uma parte significativa do acervo fonográfico nacional se encontra armazenada em um único local, uma firma terceirizada, e as condições e os cuidados não são ideais. E o fato de estar tudo junto faz correr um calafrio na espinha quando se lembra de eventos recentes, como o incêndio do Museu Nacional. De todo modo, fica a torcida para que esses e outros garimpeiros continuem nos trazendo trabalhos de qualidade e nos mostrando outras faces da nossa música.
(Publicado no Jornal das Lajes, março/2020)
Mas, voltando ao “Alta Fidelidade”, assisti a duas entrevistas interessantes com personagens importantíssimos na pesquisa e no resgate de capítulos importantes da música brasileira: Charles Gavin e Marcelo Fróes. O primeiro é mais conhecido por ter sido o baterista dos Titãs em sua fase de maior sucesso e, mais recentemente, como apresentador do excelente “O Som do Vinil”, exibido no Canal Brasil. O segundo é um ex-advogado ligado ao mundo da música há muitos anos e fundador do selo “Discobertas” e da “Sonora Editora”, ambos responsáveis por lançamentos excelentes de discos e livros. Eles se especializaram em revirar arquivos de gravadoras atrás de gravações originais de discos importantes e de material de estúdio descartado, além de raridades, como gravações de ensaios, fitas com as primeiras versões de músicas (as chamadas fitas demo, de demonstração) ou mesmo gravações caseiras ou feitas em shows.
A parte visível desse trabalho são os relançamentos, sejam de CDs individuais ou caixas de discos, cujo acabamento pode ser simples (um mero envelope para alguns CDs) ou até mesmo em formatos mais luxuosos. Charles Gavin, por exemplo, no começo dos anos 2000 lançou a coleção “Dois Momentos”, na qual uma série de trabalhos clássicos voltou ao mercado em CDs que traziam compilados, na ordem dos originais, dois álbuns de um artista ou grupo. Criticado em parte pelo aspecto gráfico, que não valorizava as capas originais (as duas capas vinham em um tamanho minúsculo na frente do CD), o projeto teve os méritos de oferecer os discos a preços populares e, principalmente, apresentar às novas gerações trabalhos há muito fora de catálogo. Fróes, por sua vez, tem no currículo um número enorme de caixas e de lançamentos de raridades, com destaque para os trabalhos com os acervos de Gilberto Gil e de Renato Russo e a Legião Urbana.
A parte invisível – e hercúlea – dessas iniciativas são as incontáveis horas de audição de fitas e as negociações sem fim com artistas, herdeiros, gravadoras e seus advogados. As fitas originais estão, em muitos casos, perdidas em prateleiras e o grande desafio é a quantidade de material não catalogado. Inúmeras caixas de fitas não possuem nenhuma identificação e a solução é ouvir uma por uma. Esse processo permitiu, por exemplo, o lançamento de um show ao vivo de Caetano Veloso acompanhado da renomada banda Black Rio, gravado em 1978, e que o próprio artista ignorava a existência da gravação. O disco só veio à tona em 2002 graças ao trabalho paciente de Gavin, que encontrou e trabalhou as fitas.
Fróes e Gavin são unânimes em apontar que há vários tesouros não lançados, seja porque artistas ou gravadoras não quiseram tocar alguns projetos para frente por razões diversas (falta de interesse, previsão de baixo retorno financeiro e outras), seja porque há material por ser descoberto. Porém, ambos fazem um alerta importante: uma parte significativa do acervo fonográfico nacional se encontra armazenada em um único local, uma firma terceirizada, e as condições e os cuidados não são ideais. E o fato de estar tudo junto faz correr um calafrio na espinha quando se lembra de eventos recentes, como o incêndio do Museu Nacional. De todo modo, fica a torcida para que esses e outros garimpeiros continuem nos trazendo trabalhos de qualidade e nos mostrando outras faces da nossa música.
(Publicado no Jornal das Lajes, março/2020)
Comentários
Postar um comentário