Minas além da Esquina

Toda homenagem que se preste ao Clube da Esquina é pouca pelo o que Milton Nascimento, Lô Borges e companhia fizeram pela música brasileira. Porém, não pretendo falar sobre o Clube que tornou a música mineira conhecida mundialmente. Ao menos não dessa vez, pois é impossível escrever sobre música sem dar o devido espaço àqueles músicos geniais. Gostaria de falar um pouco sobre o que se produziu depois do Clube e alguns artistas que julgo merecerem destaque. O desafio, porém, é na escolha sobre quem escolher, já que nosso estado é um grande celeiro de artistas e território livre onde coabitam estilos diversos.

Entre os compositores, um dos que julgo dos melhores do país na atualidade é o Flávio Henrique. A influência do Clube é nítida no trabalho desse músico impressionante, mas ele conseguiu ir além e apresentar um trabalho original e relevante. Como instrumentista, Flávio manda bem no violão, guitarra e piano, mas, em minha opinião, se destaca nos arranjos, sempre de alta qualidade. É um compositor sofisticado e dono de um extenso trabalho solo e parcerias com grandes compositores como Milton Nascimento, Márcio Borges e Zeca Baleiro.

Curiosamente, em seus discos solo como os excelentes “Pássaro Pênsil” ou “Aos Olhos de Guignard” ele prefere entregar os vocais para seus convidados. Já no seu novo trabalho, o quarteto Cobra Coral, ele solta a voz com seus parceiros de vocais: a excelente cantora Mariana Nunes e os músicos e compositores Kadu Vianna e Pedro Morais. O trabalho que começou como algo descompromissado ganhou fôlego, fez sucesso e rendeu um ótimo disco com o nome do quarteto. Aliás, o trabalho de Flávio Henrique com músicos novos é algo que merece nota. Na estrada desde os anos 90, Flávio pode ser considerado um veterano. Entretanto, sempre abre espaço e promove jovens artistas nos seus discos e composições. Recentemente, esteve também nas manchetes políticas após compor a ácida marchinha “Na Coxinha da Madrasta” criticando de forma inteligente um deputado estadual, que chegou a ameaçá-lo com um processo. Ele chegou a interromper a divulgação da música, mas já era tarde demais e ela tinha se tornado um viral na internet.

Das Gerais também saíram grandes intérpretes e se há uma cantora que tem toda minha admiração é a Titane. Mineira da nossa quase vizinha Oliveira, Titane é uma cantora de voz poderosa e de técnica impecável. Consegue aliar uma excelente presença de palco e interpretação cênica com um controle absoluto da voz, que vai com perfeição de um sussurro a um agudo altíssimo. Tal como Flávio Henrique, Titane também sempre apoiou e divulgou artistas novos, dando a espaço a nomes que hoje estão ganhando espaço como Makely Ka e Sérgio Pererê. O seu trabalho recente “Titane e o Campo das Vertentes”, que rendeu um excelente CD e DVD, foi justamente fruto de uma série de oficinas para jovens entre 15 e 25 anos, onde se trabalhava expressão corporal, preparação cênica e musical. Não basta fazer música, mas também criar espaços e incentivar.

Não bastasse esse trabalho belíssimo de promoção da música, Titane ainda foi responsável por um álbum que faz parte da minha lista dos melhores que a MPB produziu, o “Inseto Raro”, gravado ao vivo em Ouro Preto em 1996. Acompanhada somente pelo brilhante violonista Gilvan de Oliveira, Titane solta sua voz na interpretação de clássicos da MPB e canções com influência de tradições populares como o congado e folia de reis, aliás, tradições das quais Titane é uma grande divulgadora. Tive a felicidade de assistir ao show no seu lançamento e de estar presente na gravação em Ouro Preto. Perdi as contas de quantas vezes já ouvi o disco, mas é o tipo de álbum em que sempre causa aquele arrepio e a emoção de ouvir um detalhe novo. Para quem não conhece o trabalho de Titane, vale uma visita no seu site (http://titane.com.br/) onde se pode ouvir seus trabalhos mais recentes.

Focalizamos dois grandes artistas das Gerais “pós-Clube”, mas esse é só o começo. A música em Minas mantém uma produção de altíssimo nível e a cada dia novos artistas surgem acrescentando mais qualidade ao que temos para ouvir. Como disse lá na minha estreia da coluna, a música realmente vai bem.

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